sábado, 5 de março de 2011

A Manifestação de 12 de Março de 2011

Quero começar com uma declaração clara: vou participar nesta manifestação (o que em mim é uma raridade, porque não gosto de multidões...)

Esta manifestação parece-me um acto de "cidadania activa", num país que nunca teve hábitos, nem cultura, de vida cívica - o que foi ainda prejudicado, primeiro por 40 anos de fascismo, e depois pelo facto de que esta pseudo-democracia, em que vivemos desde então, ter conseguido, em poucos anos, com que os cidadãos se afastem cada vez mais da "coisa pública" e das eleições pois, de forma mais ou menos consciente, percebem que o que se discute em cada eleição (seja ela presidencial, legislativa, autárquica ou europeia) é apenas a quem vão ser dados mais privilégios, no período seguinte, para roubar os portugueses (principalmente os pobres), para se locupletarem com mordomias, e para as distribuírem pelos boys (e girls) amigo(as), para fazerem favores chorudos (e por vezes logo bem retribuídos...) aos amigos políticos e aos "amigos do dinheiro" - e permitem aos "vencidos" irem agora ocupar lugares de chefias bem pagas em Administrações de empresas privadas a que prestaram "serviços" enquanto governantes (ou de quem se esperam agora tais serviços), ou em empresa públicas (nacionais ou camarárias) conduzindo a uma distância cada vez maior entre os rendimentos dos ricos e o dos pobres.

Por tudo isto, repito, vou participar na manifestação.

Dito isto, detesto o nome sob o qual a manifestação é convocada - "Geração à Rasca" - principalmente por três razões. A primeira, porque é inestética; a segunda, porque é errónea; e a terceira, porque, por força das duas anteriores, é auto-limitativa.

O ser inestético (como era inestético e ofensivo falar de "geração rasca", ou, mais recentemente de "geração parva") não é uma questão menor, pois revela falta de gosto, e quem não consegue ter bom gosto na escolha de uma sigla, normalmente pensa mal. Como se prova de seguida.

Mais grave, é o facto de que tal designação é errónea e auto-centrada. A geração que tem hoje cerca de 30 anos e que vive na precariedade, com ou sem recibos verdes (em particular os falsos) vive evidentemente em grandes dificuldades.

Mas a geração que tem 40 ou 50, e que está desempregada, e já não consegue arranjar emprego, ou o consegue por salários de miséria, precisamente porque o desemprego e a precariedade a obrigam a aceitar condições por vezes abaixo do salário mínimo (que aliás é quase três vezes mais baixo do que de França - 1320€ -, Bélgica e Irlanda, para já nem referir o Luxemburgo - 1640€), ou vive no pavor do desemprego, ou viu recentemente cortados os seus proventos e receia que a coisa piore, para já não referir a geração de reformados, em que a maioria tem pensões de miséria e vive situações de dificuldade extrema.

Em suma, não é uma certa geração que se auto-atribui (erroneamente, mas isso é outra questão) a designação de "a geração mais bem formada que Portugal alguma vez teve" que vive "à rasca" - é todo o país (ou 90% dos habitantes dele) que vive "à rasca" - perdoe-se-me a deselegância da expressão - para que os gestores de empresas privadas e públicas tenham salários e prémios escandalosos e para que, quando hoje se fala em aumentar a idade da reforma para os 67 anos, os deputados, há muito que auto-atribuíram a si próprios, bem como a outros titulares de cargos políticos, (não apenas viagens de avião em primeira classe - aliás até há bem pouco "convertíveis em duas viagens) mas (também) reformas ao fim de 12 anos. Também muitas empresas públicas e privadas fazem reformas ou pré-reformas a partir dos 50 ou 55 anos, e o Banco de Portugal reformou, há uns anos, pessoas com 40 anos (que, todas essas, vêem para o mercado de trabalho concorrer com outros, mas podendo aceitar salários mais baixos e, com isso, diminuindo os salários dos restantes). E o CA do mesmo Banco de Portugal atribuiu a si próprio e a outros altos dirigentes reformas chorudas, e acumuláveis com outras ou com trabalho remunerado, havendo mesmo um político cuja soma de duas reformas públicas acumuláveis é tão maior que o salário de Presidente da República que - mas apenas depois de forçado - prescindiu deste.... (Duas reformas públicas por inteiro presume, em contas redondas, que o Sr. tenha 110 anos ou que tenha conseguido trabalhar 16H por dia durante 40 anos...).

Ora, que haja uma certa geração que pense que só ela vive á rasca é muito mau sinal, porque revela que ignora, ou nem quer ver, as dificuldades dos seus concidadãos de outras idades. E se não vê isso, como esperar dela que possa encontrar soluções que resolvam o problema de todos, pois só assim poderão resolver o seu? O problema é sistémico e o "sistema" não se restringe a essa geração, nem às outras que vivem à rasca". Só tem solução quando se perceber para onde vai o dinheiro que faz 90% do país viver "à rasca" e se encontrar forma de acabar com tal vergonha. E quando se perceber que foi ilegítimo muito do que se legislou ou regulou e, portanto, mesmo que não seja formalmente anti-constitucional, deve ser declarado nulo e sem valor, e isso com efeitos retroactivos.


Mas essa designação tem ainda como consequência que muitos dos que têm razões de queixa do sistema, mas não pertencem à referida geração, nem se sentem talvez tão "qualificados", pensem que "isto não é comigo", quando poderiam engrossar a manifestação, trazendo com eles uma experiência de vida e uma cultura que esta geração tão "bem formada" não tem.

Mas, mesmo assim, com uma designação deselegante, errónea e infeliz, é um movimento cívico activo e isso, sendo uma raridade em Portugal, só por isso já é salutar, e merece não apenas solidariedade distante, mas apoio activo, digo, apoio presente e participativo.

Uma nota final: que os promotores da manifestação não percebem mesmo o "sistema global" que provoca a sua precariedade, prova-o, além do já argumentado, esta ideia peregrina de convidarem para a mesma - segundo julgo ter percebido - dirigentes de partidos políticos. O que é estranho numa manifestação que se presumia "apartidária"... Ora, se é certo o conúbio entre os partidos do "centrão" que têm "alternado" no poder a nível nacional é o maior problema do actual sistema político português, são raros os que, na esquerda, não têm comportamento similar nos pequenos feudos (em geral autárquicos) em que penetram. E isso vai desde os que gostariam de copiar os Gulags que o comunismo criou onde dominou (em nome, bem entendido dos melhores princípios de "defesa dos mais fracos") até à esquerda que fala bem, veste Lacoste e celebra com whisky...

1 comentário:

  1. estou plenamente de acordo com o que disse a acrescento: VAMOS ARRASA-LOS! COM FIRMEZA E DETERMINAÇAO! ISTO TEM DE ACABAR JA

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